(Des)Amor e Carnaval

17:00



Tudo isso.



{11.01.13}

Eu acordei e o chão não foi amigo, apesar do calor com que meu pé lhe foi encontrar. E tateei o chão de olhos vendados de sono, mas só encontrei a velha sapatilha, desgastada de tão querida. Eu sou mesmo uma inadequada, aquela de sempre, agora trajada de roupa de dormir, cabelo desgrenhado e a doida sapatilha desarranjada no conjunto. Me achei tão engraçada porque era eu no espelho, de short curto chamado à cintura alta. Eu não me acostumo nunca, sabe? Continuo a puxar as roupas para cima: não tardem a me cobrir! A despeito do meu público gosto pelas que terminam cedo. Corroboro com os que dizem que eu tenho uma alma velha, anciã de gostos e anseios.

Já na sala eu me rendi ao mais famoso dos canais, li seus discursos pela retina, desjejum de café e tributo, de despertar para a nossa letargia coletiva. É segunda, de carnaval. Pavonices e velhas tralhas, desfilando com o polimento descuidado da ilusão do novo. Rememorei os amigos que deveriam estar nos festejos de Momo, cogitando as fotos e todos e os fatos que haveriam de divertir meus minutos no vouyerismo do gozo momesco.

Ia bem o dia, porque me divertia em pensar nas contradições alheias, naquela violência tergiversada no passo coletivo festivo que atravessa a avenida. Mas vi o brilho inegável da diferença de quem consumia o padrão no meio de um povo que, enfim, não se pode povo. Algo alertou do perigo latente de uma imagem daquelas. Pensei "lá vem o incômodo de todas as dores do mundo, pelo fio da cor, do gênero, da classe...", mas foi minha mas nova cicatriz que se fez perceber. Enfim, suas lembranças pedem rememória para me falar das arestas empoeiradas.

Alisei um pé da sapatilha com o outro, mais uma vez constatando pelo tato que essa sou, enchendo-me do grande conforto de ser-me e saber-me. Lá vem, angústia?

Mas o caso do desconforto é que você poderia estar ali na televisão, com seus trejeitos muito bem educados, os sorriso doces e a capacidade de encaixe sincronizado ao padrão que queira. Ainda que a cor quase denuncie e seus traços atraiçoem de vez quantas gerações se doaram para que você se camaleonasse até pertencer. Fiquei rindo dessas acusações tão sérias para mim, tão evolutivas para você, imaginando as mutilações, as controvérsias tantas que aquele meu resiliente amor me proporia por você. Mais perdões eu me presenteei, porque na televisão tudo era tão bonito de tão alegórico e, se de repente, seu sorriso caloroso e bem feito surgisse na tela, o susto hoje se daria ao riso, porque temos uma mulher crescida aqui do outro lado.

Eu quase quis abdicar das maldições adolescentes rogadas no rastro dos teus passos, quando me deixaste, a dizer-me sozinha aquelas coisas difíceis que devia ter lhe dito. Não me atrevo. Sou muito ciosa das promessas de minhas palavras, da honradez de minhas juras e, aquelas, eram de amor. Dei-as, com fúria e uns tantos penduricalhos que as camuflaram de vingança. Não as peço de volta porque caducaram e não quero aqui, ainda tão jovem, essas coisas meio loucas, lentas e agudas de que temos de cuidar por um passado em comum. Só guardo ainda o que me diz de velhices felizes. No mais, não resides mais na casa do amor, naquele beco que lhe propus viela. Acabou-se. Desde o dia em que  meu mundo precisou do latifúndio que sua imagem monopolizava.

Tchum! Desliguei a TV! Tão bom desligar! Legados desse nosso ex-amor pedagógico.

Andei na casa, arrastando os troféus. Há uma voz dengosa que me chama por vocativos do reinado de seu coração. E quanta paz! Parece que meu miocárdio aprende a ser coração para atendê-lo. Abdico das pragas. Votos e uma prece que não me atrapalha chegar aos braços do bem amado.
Boa sorte.

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