Na dúvida, eu dei, no dia 14 de agosto de 2010

19:34

Ônibus cheio, dia controverso, um sábado incomum. A tarde inteira sob a visão do Apocalipse. O mundo vai acabar. Não porque sejam todas as informações que vi um amontoado de apocalípticas novidades. Pior, é porque elas se repetem e reinventam quando eu as queria obsoletas. O mundo vai acabar, mesmo.
Ônibus lotado, desafiador da pobre física elitista que não conhece a rotina dos pobres. Eu estava mesquinha e cansada. Meu banho no meu banheiro, minha cama em meu quarto, meu cansaço e repasto em meu típico fim de dia.
Ela entrou, e encarnava pedinte todos os possíveis miseráveis do mundo, toda a tormenta e confronto que não se quer no mesquinho fim de dia. Pedia humilde, aflitiva e sincera. Sua dor doía minha felicidade, minha sucessão de dias felizes, de amparo, de amor, de pouco sobressalto. Condoía minha trajetória tranquila e envergonhava minha vontade de transformar o mundo que, talvez, em algum ponto infeliz tenha se resignado em reformá-lo apenas. Ainda assim, eu era firme em minha impáfia costumaz que tanto critica o meu genitor. Não dar esmola, não dar esmola, não pactuar com isso, não pactuar com isso! Gritavam minha anjinha e minha diabinha, em uníssono, não havia por onde, entre bem e mal, proceder em meus parâmetros.
Mas, eu estava cansada e sou um ser humano, aliás, adoro essa desculpa, essa que precisaram inventar, da minha pretensa humanidade. Estava cansada, sou ser humano e há, lá em um tímido recôndito, há algo que se sente dolorir quando alguém diz que sente dor e medo, quando pede humilde para sobreviver, só por mais essa noite. Há algo que se envergonha de dormir cansada, mas amparada, enquanto alguém, em constante sobressalto, vigia por seu próprio corpo, que também eu ajudo a violar as vezes por omissão.
Há algo que se sente dolorir por ainda tirar essas conclusões piegas e tão verdadeiras e ver que nem... e que nem... [inscreva também suas angústias aqui, nas minhas-nossas reticências]
Na dúvida, eu dei, dinheiro, e não sei se ela viu que eu pedi que fosse feliz, que dispusesse do meu pouco e dos outros vários poucos com o mínimo prazer que fosse. Entorpeça sua dor, da maneira que bem lhe aprouver, eu pedi tácita e calada estendo o vil cobre. Pena eu não ter dito com minha voz e palavra.
Segui com vergonha de ser tão descaradamente feliz. A má posição no ônibus não doeu mais, o cansaço era só detalhe e minha vida, em meu mesquinho típico fim de dia, foi menos pesada. Graças a um escapismo eficaz, ao menos para mim.
Dei mesmo. Feliz ou infelizmente.

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