Falava de uma amor que ressurgia, do medo e da entrega. Parecia ter sido feita para nós dois. Pensava que ela tocaria mentalmente quando mais uma vez eu corresse para você, tropeçando nas precauções do roteiro e sentindo meu corpo expandir, como se fóssemos demais para minha existência.

Senti que cada palavra chorava entre risos, como na rendição que sonhei que você roubaria à minha cautela.

Era demais crer que você tivesse me amado uma só fração de segundo e que, nas colagens temporais de nossos momentos, um só instante que fosse, eu tivesse olhado em seus olhos e encontrado repasto em um amor forjado ao meu gosto.

Ouvindo-a, tencionei perguntar à gaveta se esse olhar desbotava-se na sua escuridão, se estava lá também aquele coração que lhe dei, com todos os perversos remendos que você me aliciou a tecer. Não ia prometer pulinhos ao santo para encontrar um milagre na gaveta, nem ia querer a lembrança de um pedaço estranho de um eu que já não sou.

E de modo algum correria novamente para você, usando as forças de um coração novo, que anda em outro peito, que dói em outros fatos e suspira outros amores. Não corro mais. Não correria, doida, anacrônica, cética. E amputada.